Projeto Mãos Que Fazem da Prefeitura de Capivari acolhe e trabalha as potencialidades de pessoas que esqueceram da importância de suas vidas na sociedade
A dona de casa, Lourdes da Silva, foi uma das primeiras alunas a se inscrever nos cursos oferecidos pelo Cras (Centro de Referência de Assistência Social) Segundo ela, todos os dias tinha a necessidade de ‘inventar’ alguma coisa para fazer em casa, com o objetivo de se sentir melhor. Resultado de um estágio depressivo, Lourdes conta que não sabia mais o que fazer de sua vida, sendo que quando o Cras foi inaugurado vislumbrou uma luz no fim do túnel. “Eu achava que não ia conseguir e hoje eu consigo até fazer os trabalhos sozinha em casa. Continuo fazendo todos os cursos e até hoje, quando não venho ao curso, tenho a sensação que não existo”.
Edson Modesto concorda com a amiga de curso e encara as aulas como terapia. Ele lembra que quando não fazia parte do grupo, passava os dias assistindo televisão ou brincando na casa do vizinho, o que não era muito frutífero. Realidade completamente diferente da atual, já que passa a maior parte do tempo da semana no Cras. “Minha mãe até fala brincando para eu mudar para cá de vez, porque fico mais aqui do que em casa”, comenta sorrindo.
Essa sensação acomete todos os alunos dos diversos cursos ministrados pelo projeto Mãos que fazem, inclusive a recém-companheira de sala, Maria de Fátima Leite, que participa das aulas há apenas dois meses. A história de Maria comprova que mais um caso de depressão está sendo tratado por meio dos cursos de artesanato.
Ela conta que já não tinha mais força para realizar os trabalhos domésticos, pois estava muito desanimada com a vida. Sendo que apesar do pouco tempo de história junto ao grupo, essa realidade mudou muito. “Hoje mesmo corri para arrumar minha casa, deixar tudo limpo, para vir para o curso. Fiz essa escolha porque não queria me tornar dependente de antidepressivo”, esclarece.
Esses depoimentos emocionaram tanto a professora de artes, Sílvia Cristina Farias, como a responsável pelo Cras, Giovana Cardoso, que entende o grupo como uma grande família em que um precisa do outro para sobreviver.
Com lágrimas nos olhos, a professora Sílvia comentou que não existem palavras para definir a satisfação em realizar o trabalho, sendo que a relação entre professor e aluno ultrapassa os moldes convencionais de ensino. “Não os considero mais como meus alunos, e sim como meus fiéis escudeiros. Eles são minhas pernas, meus braços, enfim, somos parceiros, companheiros”, declara.
A emoção também toma conta de Giovana que enfatiza as inúmeras conversas realizadas entre o grupo focando sempre nos sentimentos dos envolvidos e na importância destes para a sociedade. “Eles são maravilhosos, esforçados, bondosos”, define.
Os cursos
O espaço oferece aulas de pintura em tela, de pintura em madeira, de lembrancinhas para festas e de reciclagem, no qual garrafas e embalagens recicláveis, retalhos de tecido e jornal, entre outros materiais, são utilizados e transformados em arte. Arte está que mexe ativamente com a sensibilidade do grupo.
Além dos resultados terapêuticos obtidos com os cursos, os materiais produzidos pelos alunos são vendidos em feiras de artesanato e exposições resultando em geração de renda a estas pessoas que não estão inseridas no mercado de trabalho.
É importante evidenciar que são nesses eventos que os alunos, ou melhor, os artesãos, notam a valorização de suas obras. “Para mim é como se fosse uma vitória. Como se eu fosse reconhecido pelas coisas que a professora ensina”, defende Modesto. Lourdes concorda com o companheiro de oficio e declara: “É um orgulho muito grande. Não conseguia fazer nada e fico muito feliz vendo que o que produzo é vendido e admirado”.
Essas sensações retomaram o direito de sonhar de todo o grupo. Lourdes sonha em montar um ateliê e trabalhar com a professora Sílvia, podendo ajudar ainda mais as pessoas que querem aprender. Já a novata Maria de Fátima pretende dar continuidade ao curso e se tornar uma voluntária, ministrando aulas de tricô. Esse desejo é o de muitos alunos e por isso o grupo já institui o Dia do Professor. Nessa data a professora virará aluna e os alunos professores, estimulando ainda mais a troca de experiências.
Visando intensificar a venda das obras de arte, o grupo já se organiza para montar uma cooperativa que será voltada para a venda dos produtos. Palestras sobre empreendedorismo já foram ministrados, e outras ainda o serão, sendo que a documentação da cooperativa será providenciada no final deste ano. A expectativa é que no ano que vem todos possam vislumbrar novos horizontes, instituindo, definitivamente, o ofício adquirido: de artesão, remunerado.